O que nos resta?
Renomada médica e cientista vê-se envolvida no centro das mídias quando nega ministrar, por um padre católico, a extrema unção a uma paciente terminal.
Tudo é filmado e como acontece, também, nos dias de hoje, começa o julgamento público via notícias falsas – comentários sem base e discursos de ódio dirigidos à médica e ao próprio Instituto que trabalha. A partir daí, corre o risco a Instituição mantenedora de perder o seu patrocínio frente à repercussão negativa do “tribunal da mídia”.
Tudo isto causa uma comoção interna e externa – começam aí questionamentos entre colegas de trabalho, na equipe comandada pela médica, em temas como racismo, religião, gênero e profissionalismo. No seu interior inicia-se um processo que a leva a questionar-se quanto ao seu profissionalismo, dedicação à medicina e à vida privada e a gênero.
Quem é ela frente a este mundo talvez, até hoje, desconhecido e cruel, que se apresenta aos seus olhos?
Nada – Ninguém.
Nua, frente ao dilúvio de palavras, fatos e sentimentos reprimidos nem assumidos. Reflete no mais íntimo seus valores e profissão.
Clara Carvalho, a protagonista, Dra. Ruth Wolff, com dicção perfeita, madura, em interpretação realista – é a linha do espetáculo. Sentimento e corporalidade sublimes desliza sua figura no palco com talento e profissionalismo, encarnado a médica com paixão e verdade cênicas.
O texto de Robert Icke joga em cena muitas questões não resolvidas – só jogadas; por vezes o texto fica cansativo ao público que assiste na repetitiva prosa. O Diretor Nelson Baskervilhe encontra o melhor caminho na cena final.
O que, depois de tudo, fica frente ao que nos rodeia e desestabiliza?
Fica o sentimento com o outro mais próximo de nossas vidas, singelo, intimo,-solitário e único.
Nelson Baskerville é um dos melhores diretores da cena paulista – preciosista com os atores e a encenação, mostra-nos que o desenho da direção é o ponto alto desta montagem. Tudo e todos estão no lugar e momento certos com emoção na pele.
O grupo de atores experientes percorre a obra com vigor e verdade: Adriana Lessa, Anderson Müller, Cella Azevedo, César Mello, Chris Couto, Isabella Lemos, , Luisa Silva, Sergio Mastropasqua e Thalles Cabral.
Meu destaque entre os atores é Kiko Marques, de personalidade forte e brilhantismo em sua interpretação.
A peça é permeada por música ao vivo e trilha sonora, criando os tempos e emoções exatas de cada cena. Gregory Slivar, Edézio Aragão criam o clima propicio para cada momento
O cenário inteligente-moderno, de Marisa Bentivegna, cria espaços físicos e mentais para cada cena, acompanhado pela precisa e bela iluminação de Wagner Freire.
O figurino de Marichilene Artisevskis, bem conceituado
Ao fundo do palco as projeções em monitores não acrescentam muito à montagem. André Grynwask e Pri Argoud experientes na área, não conceitualizam bem as imagens
A produção de SM Arte Cultura – Selene Marinho, produtora que ama o que faz, o círculo de atores e todos envolvidos apresentam produção requintada e de conteúdo.
Vale a pena assistir “A Médica”, que encanta corações e mentes com atores, direção e produção, onde cada artista mostra a que veio no meio
teatral.
Pamela Duncan
Revisão- Alice Eugenia
Blog Pensamento www.pameladuncan.art.br
Local: Auditório do Masp
Temporada: 20 de junho a 24 de agosto, exceto dia 22/06 (domingo). Sextas e sábados às 20h, domingos às 18h
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