O Flagelo Diário
Carne Viva foi encenada pela primeira vez há dez anos, em Portugal, pela autora numa companhia de teatro local de Lisboa. Chega ao brasil inédita em 2025 .
A dramaturgia foi originalmente escrita em 2003 por Luh Maza a partir de pesquisa sobre a mulher na história, com o recorte do papel de esposa na cultura ocidental dos séculos XIX e XX.
A ação se passa dentro da mente de uma personagem quando em, no preparo de um pedaço de carne para saciar a fome de seu marido – entra em uma vertigem de pensamentos onde vê-se como Jesus Cristo – o Deus masculino da sociedade patriarcal.
Para a cena de Carne Viva Luh Maza traz o gênero da tragédia e a sua relação com o terror. Ela nos fala que a proposta é provocar uma experiência de sinestesia dentro da sala do teatro, numa fruição que não tem sido tão experimentada no teatro atual, voltando-se mais a depoimentos e discursos pessoais que à fantasia. A proposta é aproximar da linguagem cinematográfica.
Diretora preciosista apresenta-se cuidando de todos os detalhes para que a sua obra chegue da melhor maneira ao público; mostrando uma proposta pós-moderna na concepção e no todo que acompanha a encenação .
A Atriz Christiane Tricerri, ponto alto da encenação, madura na interpretação, mostra seu talento a cada movimento. Ela só, em cena, bastaria, se a diretora tivesse continuado com a proposta inicial de monólogo.
O figurino, de Telumi Hellen e Mari Morais, embeleza ainda mais as personagens. Houve muito cuidado na escolha dos tecidos e na mão de obra.
A iluminação de Aline Santini e a musica original de Bruno Campos acompanham uma montagem de ótima qualidade artística.
O texto de Luh Maza parece “envelhecido” para o o estilo escolhido por ela mesma, dirige-se a nós, mulheres das urbes, na luta do dia a dia.
O texto não causa emoção nas mulheres que assistem a montagem; não existe empatia e clareza com os dias de hoje. Faltou trabalho da diretora na construção do interior das personagens e das atrizes que dia a dia, de uma forma o outra, sofrem em Carne Viva o segundo plano e a violência expostas.
Diariamente mulheres são violentadas e mortas. A realidade não muda e grita seus números.
Luh Maza fica nos devendo mais visceralidade na abordagem deste flagelo, como falava Antonin Artaud, mantidos o esmero e talento que mostrou na proposta desta encenação e produção.
Temporada: de 28/3 a 12/4, sextas e sábados, às 17h
> Local: Teatro do Sesc 24 de Maio. Rua 24 de Maio, 109, República, São Paulo (350 metros da estação República do metrô). Lotação: 216 lugares.
Pamela Duncan
Alice Eugenia -correção
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